terça-feira, 25 de setembro de 2012

Relato de Experiência

Carmim: Experimento Água (Recife)
                 Sexta, 21 de setembro de  2012



                       A vivência de ontem, dia 20 de setembro de 2012, foi única a começar pelo espaço, repleto de natureza e vida. Um ambiente novo para o nosso olhar. Chegamos à Universidade Federal de Pernambuco perto das 10h e fomos descobrir o espaço onde seria jorrada a nossa água e descobrimos “O Lugar”, que de inicio possuía algo que incomodava algumas pessoas, o chão era de cimento. Tratava-se de um quadrado descoberto, com quatro árvores, próximo a corredores, com um ponto de água e uma mangueira branca e grossa, que podia jorrar bastante água. Estabeleci contato com as árvores me apoiando nelas, sentindo seu cheiro, abracei-as, tirei meus calçados para sentir o chão, e olhei para o céu coberto pela copa das árvores, tudo isso em busca de conhecer melhor aquele lugar. A monitora de fala tranqüilizante nos chamou para mostrar onde seria nosso camarim e a seguimos até lá, deixamos nossas coisas e fomos comer algo e voltamos para nos preparar. Nara chegou e me ajudou com o vinho. No camarim foi aquela descontração, um ajudando o outro, risos, uns brincavam, outros alongavam. Vestidos e maquiados, com seus elementos de cena em mãos, Nara propôs um momento de concentração, ficamos unidos pelos ombros em circulo girando para um lado e depois para o outro, apenas nos olhando. Como tem gente bonita no Cruor! Olhava para aqueles rostos, e sentia algo tão bom, era como se eles me dissessem “Hoje vai ser lindo!”. Me senti uma pessoa de sorte por estar ali. Depois começamos a organizar o cardume e balançar, balançar, balançar, respirar junto, até nos transformarmos em um corpo só, com um só som, uma só respiração. Um corpo pulsante. Nara pediu que começássemos a pegar nossos elementos de cena e caminhar para a porta de onde iria sair nosso cardume, foi ai que eu tive a certeza de que não estava sentindo esta unidade sozinha, pois todos saíram do bolo para seus elementos no mesmo ritmo, caminhamos para a porta possuídos por uma concentração que nunca tinha acontecido antes.
                Chegando ao ponto de partida, nos recolocamos em cardume e voltamos a balançar, repetimos o que havíamos feito dentro do camarim, só que dessa vez com os objetos. Patrícia estava do meu lado e em um momento acabou deixando seu pincel cair espalhando um pouco de tinta vermelha no chão, levei um pequeno susto na hora, mas quando vi a imagem que havia sido construída no chão, pensei: essa ação já estava pintada de alguma forma. O lugar estava cheio. À medida que balançava ficava no limiar entre olhar aquelas pessoas e fechar os olhos. Fernanda começou a tocar e o corpo começou a andar até que aos poucos foi se fragmentando, cada órgão foi ganhando sua autonomia dentro daquele espaço.
                Fiz tudo diferente, pouca coisa se manteve do que já havia feito. Senti minha partitura de ações mais madura. Andei até um ponto e parei numa imagem diferente da de costume e olhei ao redor, um cara me olhava e mantive meu olhar no dele, peguei meu vinho e fui andando até ele como os olhos fitados nos dele, ofereci-lhe o vinho e sussurrei em seu ouvido a poesia desenvolvida no laboratório, da mesma maneira como fiz das outras vezes, a diferença era que lá estabeleci outra regra: Só iria oferecer vinho àqueles que me encarassem sem desviar o olhar. Muitas pessoas se incomodaram e desviaram a atenção para outra coisa, alguns, se envolveram de tal maneira que quase fui beijada.  Sandro me encontrou, nós brindamos e ele roubou meu vinho. Foi aí que minha cena mudou do vinho para a água, comecei a por para fora partituras feitas no laboratório, que até então tinham ficado adormecidas. Arrumei meus cabelos e a medida que arrumava meus cabelos comecei a bater na minha cara, borrando meu batom: “Yo soy la desintegracion”. Sandro apareceu na minha frente dançando com o vinho e eu comecei a dizer para ele, em voz alta, a poesia que sussurrei nos ouvidos e ele me afogou de vinho e me deixou. Me veio uma imagem de “Tudo Sobre Minha Mãe” em que a mãe teve um caso com um travesti. Me recuperei, tirei meus sapatos, Helo lavou os meus pés, tentei transformar meus sapatos em ombreiras. Helo lavava meus pés apressadamente, como se quisesse tirar toda a sujeira de minha alma. Deixei-a calcei meus sapatos e voltei a encarar as pessoas. Encontrei Sandro novamente e começamos a dançar com a garrafa dele no meio de nossos corpos, segurada pela barriga e Lulu disse: “Quando eu beijo, pinto gametas molhados” (algo assim) e eu e Sandro começamos a nos beijar, sem perder a dança que já estava sendo construída. A ação foi interrompida pela garrafa que caiu e cada um voltou para a sua partitura isolada. Peguei a garrafa e voltei para a minha ação inicial. Encontrei Lulu manca com sua bacia e lhe dei uns goles de vinho deixando o liquido escorrer pelo seu corpo. Tive minha garrafa roubada de novo por Sandro, nós dois brindamos e fui afogada de novo com o vinho. Fui para o chão e o texto que falava enquanto estava sendo afogada com a mangueira nas intervenções anteriores começou a ser dito no chão, me levantei repetindo o texto e vi a mangueira jorrando água como um chafariz, fui até lá e me banhei como a Camem Maura em “A Lei do Desejo”. O texto que antes botava para fora como se estivesse sendo estuprada agora era dito com prazer. A mangueira jorrava água numa imagem tão linda que não precisava mais de nada, acabei minha ação ali. Andei até um ponto e parei, Lulu também foi para lá, ela ria de Keila que carregava Pateta. Keila chorava e Lulu gargalhava daquilo, todos se uniram novamente e o Corpo voltou a andar junto rumo ao camarim.
Aplausos. Para mim o Carmin: Experimento Água, nunca foi tão aplaudido. Meu coração aplaudia também. Perguntei pra Helo o que ela tinha achado e ela disse que ficou querendo voltar, eu também queria. 

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